sexta-feira, 24 de junho de 2011

Clarice Lispector

Minha alma tem o peso da luz..Tem o peso da  música.Tem o peso da palavra nunca dita, prestes quem sabe a ser dita. Tem o peso de um lembrança. Tem o peso de uma saudade. Tem o peso de um olhar.pesa como pesa uma ausência.. E a lágrima que não se chorou. Tem o imaterial peso da solidão no meio de outros.

quarta-feira, 10 de junho de 2009

EU

            Olá, permitam-me que me apresente. Já fui importante nesse país, por mim passaram presidentes, mestres, doutores, cientistas e todos que fizeram o progresso desse país. Já fui sinônimo de competência, fui cobiçada, era um orgulho fazer parte dos meus quadros. Antes não precisava ser avaliada, meus resultados falavam por si só, em todos os campos  do conhecimento desse pais afora ninguém ousava duvidar da minha qualidade e competência,nunca fiz distinção, pelas minhas portas passavam pobres e ricos, brancos e negros todos com igualdade de condições, pois é, fui sinônimo de isonomia e de respeito por muitas gerações.

            Mas, vejam só vocês como com o tempo e com o desrespeito tudo pode se transformar, hoje já não afiro mais  qualidade, só quantidade, por isso inventaram de me avaliar, hora primeiro me destruíram, tiraram de mim toda a credibilidade que conquistei, fui execrada por décadas e décadas sem piedade, pasmem todos, eu não cobro, mas sou preterida frente a que é paga, esta dispõe de todas as condições de boa existência, inclusive incentivos financeiros daqueles que me criaram, enquanto isso estou agonizando em uma crise existencial que não tem fim. Como já falei se não bastasse estou sendo avaliada e como era  de se esperar meus resultados são dignos de unidade intensiva de tratamento (UTI), sou daqueles pacientes que entram em estado vegetativo e os médicos mandam apelar a um milagre, porque se me tirarem os aparelhos deixo de existir.

            Mas os meus donos, àqueles que atentaram contra minha integridade não me deixam “morrer” chegam sempre com uma droga nova que só piora meu estado, o interessante que agora só se aproxima  de mim àqueles que iguais a mim são vítimas de um sistema econômico que consegui promover o apartheid social por onde passou; e o pior que convalescente e sem forças para lutar me sinto violentada pela  segregação das cotas, um racismo disfarçado para esconder toda a incompetência daqueles que me destruíram e me tiraram toda a dignidade. Não falta mais nada, me tornei tão incapaz que aqueles que hoje passam por mim são dignos de pena de quem  me criou e por isso são agraciados com  o atestado da piedade e da incompetência.

            Nem preciso mais dizer quem sou, porque na verdade eu fui.



Autor: José Iran Pinto